quarta-feira, 11 de fevereiro de 2004

Feérico, esse portento que bem se poderia chamar Américo

Antes de mais não liguem ao título, que pouco tem a ver com o post, mas parti-me a rir quando me lembrei dele (enfim, caprichos).

Reza a história que, quando alguém acaba o curso, começa a mandar currículos para ingressar no mundo do trabalho. Vai daí, para além de serem contemplados os diversos anúncios, uns currículos distribuídos por amigos, conhecidos, amigos dos conhecidos, merceeiros, motoristas de autocarros, octagenários a jogar à sueca no jardim do Campo Grande são parte do processo, proclamando desta forma o recém licenciado a sua palavra. Maneiras que, um belo dia num escritório muito muito distante, este humilde pastorinho recebe um currículo de um conhecido de um amigo de um amigo. Este currículo vinha acompanhado de uma carta de apresentação que considero qualquer coisa de extraordinária. Meus amigos, mais uma vez lembro-vos que é uma carta real e que não tentem isto em casa, correndo o risco de nunca na vida arranjar emprego:

"È de forma excelsa e magnificente que me subscrevo a Vossa Excelência, tendo como principais e primordiais objectivos a disposição inteira e pormenorizada dos meus dados pessoais, de forma a que seja facilitada a Vossa Excelência a procura de elementos que integrem a sua equipa.

Um dos meus outros objectivos diz respeito à minha inclusão rápida e eficaz no mercado de trabalho(numa espécie de estágio profissional, ou trabalho efectivo), tendo escolhido para isso um grupo com capacidade brutal de performance nos mais diversos indicadores, o qual possui elementos símiles às capacidades que eu considero como feéricas para vencer todos os desafios do mercado.

Por tal, espero que considere a minha mais humilde e subtil proposta.

Sem mais, me despeço,

(...)
"

Fantástico. Um génio, iluminado pela vida e por uma veia artística crítica. Parece que o estou a imaginar, sentado à frente do computador, um whisky numa mão e um charro na outra, dicionário ao canto da mesa, e após um processo de, como exprimir-me melhor... diarreia mental, produzir este belo texto. Gosto particularmente de:
- Iniciar a carta com "È de forma excelsa e magnificente que me subscrevo a Vossa Excelência" para a terminar com "Por tal, espero que considere a minha mais humilde e subtil proposta". Humilde???? Valha-me a Fátima. E subtil??? Sim, mal se deu por ele;
- "(...)tendo como principais e primordiais objectivos a disposição inteira e pormenorizada dos meus dados pessoais, de forma a que seja facilitada a Vossa Excelência a procura de elementos que integrem a sua equipa". Sim, pois claro, o facto de ficar empregado é um nice to have pois o que ele quer mesmo é safar o coitado do patrão da inglória tarefa de constituir uma equipa.
- Dizer explicitamente que "(...) diz respeito à minha inclusão rápida e eficaz no mercado de trabalho(numa espécie de estágio profissional, ou trabalho efectivo)"... estágio, trabalho efectivo, tirar fotocópias, part-time, uma coisa qualquer... a malta não é esquisita.
- "tendo escolhido para isso um grupo com capacidade brutal de performance nos mais diversos indicadores"... estou a imaginar, uma empresa de trogloditas, a atacar de forma brutal o mercado, espancando tudo o que é indicador de performance... até fico comovido.
- Rematar com "o qual possui elementos símiles às capacidades que eu considero como feéricas para vencer todos os desafios do mercado". Para mim, temos aqui o a cartada de mestre. Para quem não sabe, feérico significa "mágico", "maravilhoso", "esplendoroso", e afirmar que a empresa tem capacidades mágicas para vencer os desafios do mercado, meu amigo, ponha-se mas é a pau com as finanças pois por menos que isso já muita tinta correu nos últimos tempos. (a Enron por exemplo, era um bocadinho feérica na sua contabilidade).

Obviamente que esta carta não seguiu para os Recursos Humanos, uma vez que a vida está difícil e precisamos manter o emprego, e convenhamos que após sugerir aqui o feérico amigo nunca mais me levavam a sério na vida.

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